Quem sou eu

Escritor,roteirista e pesquisador da história e cultura pantaneira, recebeu vários e importantes prêmios literários, entre os quais o “Brasília de Ficção”, com o romance “Raízes do Pantanal”. O conto, “Nessa poeira não vem mais seu pai”, ficou como finalista entre 967 concorrentes do Concurso Guimarães Rosa, promovido pela “Radio Françe Internationale” em Paris. O mesmo conto transformou-se numa peça de teatro produzida pelo Grupo Teatral Minas da Imaginação e, roteirizado pelo próprio Autor, num curta metragem infanto-juvenil, “A poeira”, atualmente exibido no Programa Curta-Criança 3 da TV-Brasil do Rio de Janeiro. O Conto "O caso de Joanita" foi roteirizado para um média metragem, dirigido e produzido por Reynaldo Paes de Barros. A sua obra é referência em teses monográficas e vem sendo analisada e estudada nas universidades de Mato Grosso, Mato Grosso do Sul. Tem artigos, crônicas, contos, ensaios publicados em jornais, revistas, sites da Internet e entrevistas dadas a televisões e rádios nacionais e internacionais. Considera-se um ser mais biodegradável do que biografável, pois nasceu em Corumbá,MS, Cidade-Natureza.

quinta-feira, 17 de fevereiro de 2011

TREZE DE JUNHO
Augusto César Proença

"A Retomada de Corumbá" aconteceu no dia 13 de junho de 1867.
Àquela época, Corumbá era apenas uma pequena vila à beira de um grande rio. Tinha um largo sombrio (onde hoje é a Praça da República), uma modesta capelinha, a cadeia, o quartel, o cemitério, algumas residências que se espalhavam ao redor desse largo e se adentravam por algumas ruas já traçadas e retas, obedecendo o plano urbanístico elaborado pelo almirante Raymundo Delamare. A Ladeira Cunha e Cruz, por exemplo, era apenas uma picada íngreme e mal ajeitada, dando acesso ao porto, onde algumas casas comerciais ainda resistiam desde a invasão paraguaia. O resto era a realidade de uma vila estagnada, esvaziada, cheia de doenças e pobrezas.
Por mais de dois anos, desde o dia 3 de janeiro de 1865, mantiveram-se os paraguaios como senhores absolutos da povoação, sem que fossem de nenhum modo importunados.
No entanto, o Dr. José Vieira Couto de Magalhães, assumindo o governo da Província de Mato Grosso, resolveu expulsar os inimigos do solo corumbaense. Aceitou o plano de ataque concebido pelo Capitão Antônio Maria Coelho, comissionou-o ao cargo de tenente-coronel e organizou três corpos expedicionários. O primeiro comandado pelo próprio tenente-coronel Antônio Maria Coelho, o segundo por ele mesmo, o governador, e o terceiro pelo major João Carlos Pereira Leite, que sairia de São Luís de Cáceres.
A 15 de maio de 1867, partia de Cuiabá o primeiro corpo expedicionário composto de 400 homens, embarcados em canoas, rebocados pelos vapores Antônio João, Corumbá, Jauru, Cuiabazinho e Alpha.
Os pantanais, ainda cheios, facilitaram as manobras do experiente comandante que, sabendo-se cercado por não menos experientes soldados, atacaria a Vila de Corumbá pelo sul e não pelo norte, para o qual deveria estar atento o inimigo. Assim, a tropa foi bater à margem esquerda do Baixo São Lourenço, no porto do Alegre. Os vapores voltaram para Cuiabá, enquanto as canoas, conduzindo a tropa, seguiram pelas águas da enchente, vencendo macegas, todos os imprevisíveis caminhos de uma noite escura, até chegarem ao Barrote, abaixo de Ladário, a 11 de junho. E, então, por ter-se extraviado um dos oficiais com seu pelotão, a coluna foi obrigada a seguir até o Rabicho, onde se deu o desembarque das canoas.
Na madrugada de 13 iniciou-se a marcha rumo à Vila de Corumbá. Uma marcha penosa. Antônio Maria Coelho e seus soldados tiveram que fazê-la com a água batendo na barriga, até alcançarem os morros e pegarem a velha estrada pela qual o Barão de Vila Maria costumava viajar para sua fazenda, nas proximidades do Morro do Urucum.
Os soldados brasileiros atingiram Corumbá numa tarde brusca e fria, pegando os paraguaios de surpresa, muitos estavam atacados pela epidemia da varíola.
A Retomada de Corumbá foi uma surpresa que causou mortes. Não foi fácil como muitos imaginam. Houve fuzilaria. Houve combate no qual perdeu a vida o Capitão Cunha e Cruz, como também muitos irmãos paraguaios, cujos corpos foram lançados ao rio. Houve o heróico combate do Alegre, durante o qual se destacaram, entre tantos, o capitão-tenente Balduino José Ferreira de Aguiar, o major Antônio da Costa e o soldado Chiba que, apesar de ter o corpo forrado de bexiga (a peste da época) sem camisa, todo esfolado pelas pústulas, o peito nu, a cintura em carne viva, não deixou de abrir fogo contra o vapor Salto de Guaíra, veloz navio de guerra paraguaio, mandado em perseguição às forças brasileiras.
A posse efetiva da vila não se daria no dia 13 de junho, como se esperava. Os paraguaios ainda permaneceram em Corumbá por mais algum tempo, porque o presidente da Província de Mato Grosso, alarmado com a epidemia de varíola, ordenou fosse a vila abandonada e os paraguaios, encontrando-a deserta, voltaram e a ocuparam novamente. Deixaram-na, finalmente, no dia 3 de abril de 1868.
Terminada a guerra com o Paraguai, Corumbá entrou numa fase de ressurgimento. A fronteira, é verdade, encontrava-se arrasada. Necessitou de bastante esforço para recuperá-la. É interessante afirmar que muitos paraguaios, depois da guerra, vieram para Corumbá e foram elementos fundamentais na reconstrução das ruínas e na recuperação das fazendas de gado. Trouxeram suas ferramentas, seus laços endurecidos, seus amargos tererés, suas lindas guarânias e foram apagando da lembrança coletiva as consequências de uma guerra injusta, formando uma sociedade de gente livre, forte, sobretudo amiga e fraterna.

Augusto César Proença é escritor autor de Pantanal, Gente, Tradição e História entre outros livros.

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