Quem sou eu

Escritor,roteirista e pesquisador da história e cultura pantaneira, recebeu vários e importantes prêmios literários, entre os quais o “Brasília de Ficção”, com o romance “Raízes do Pantanal”. O conto, “Nessa poeira não vem mais seu pai”, ficou como finalista entre 967 concorrentes do Concurso Guimarães Rosa, promovido pela “Radio Françe Internationale” em Paris. O mesmo conto transformou-se numa peça de teatro produzida pelo Grupo Teatral Minas da Imaginação e, roteirizado pelo próprio Autor, num curta metragem infanto-juvenil, “A poeira”, atualmente exibido no Programa Curta-Criança 3 da TV-Brasil do Rio de Janeiro. O Conto "O caso de Joanita" foi roteirizado para um média metragem, dirigido e produzido por Reynaldo Paes de Barros. A sua obra é referência em teses monográficas e vem sendo analisada e estudada nas universidades de Mato Grosso, Mato Grosso do Sul. Tem artigos, crônicas, contos, ensaios publicados em jornais, revistas, sites da Internet e entrevistas dadas a televisões e rádios nacionais e internacionais. Considera-se um ser mais biodegradável do que biografável, pois nasceu em Corumbá,MS, Cidade-Natureza.

segunda-feira, 28 de fevereiro de 2011

“BOA TARDE, BOA TARDE, MAIS UM ANO PASSOU...”

                                                Augusto César Proença
      
      Corsos de colombinas e pierrôs enleados em serpentinas, cordões como Pau Rolô, Sempre Viva, Rojão da Mocidade, e blocos como o Mama na Burra e Pancada  de Cego faziam a festa na Av. General Rondon, quando ainda não rolava desfiles de escolas de samba.
        Nos anos 30 do século passado, um folião se destacou: era o Mané Só, todos os anos botava seu cordão na rua, tendo como mascote um menino negro, magrinho, chamado Flaviano da Conceição, o Favito, que cresceu ali pelo Bairro da Cervejaria e se tornou figura das noites corumbaenses, boêmio, puxador de samba, querido dos carnavalescos que o auxiliaram a fundar e a levar em frente a Escola de Samba Flamengo, várias vezes campeã  dos velhos carnavais.
        O carnaval corumbaense foi se desenvolvendo e novos cordões surgiram, todos eles com nomes poéticos: Pingo de Amor, Cravo Vermelho, Paraíso dos Foliões, Estrela Azul, Flor de Corumbá... Aliás, os cordões (desaparecidos nos outros locais) em Corumbá continuaram a desfilar e garantem até hoje a tradição do Carnaval, a exemplo do Cravo Vermelho, Paraíso dos Foliões e Flor de Corumbá, os pioneiros.
        Os marinheiros de Ladário trouxeram para Corumbá a primeira Escola de Samba. Chamava-se Deixa Falar. Esses marujos eram do Rio de Janeiro e com eles vieram o ritmo, a cadência e a ginga do carioca sambar.
        Uma coisa interessante é que nos anos 40, 50 e 60 do século passado existiam os “avanços carnavalescos” nos clubes da cidade, conteciam nos fins de semana, meses antes da folia de Momo começar. O Rei Momo e a Rainha eram acompanhados por dois príncipes e duas princesas que percorriam os bailes dos clubes (muito concorridos por sinal). Iam ao Corumbaense, ao Riachuelo, ao Grêmio dos Subtenentes e Sargentos, ao Marítimo, aos clubes de Ladário e não deixavam de “subir o morro” para dar uma passadinha no salão da saudosa Maria Mulata.
        Blocos formados por criativos rapazes da sociedade animavam os desfiles e acendiam as chamas da animação dos carnavais de outrora. O Formigueiro, o Turista, o Can-Can, o dos Brotinhos deixaram marcas e fizeram a glória dos salões e das ruas.
        Sim. Os carnavais corumbaenses deram exemplo de animação, de espiritualidade nas fantasias e nas piadas de salão.
       Os blocos de sujos e as “batalhas de confetes” realizavam-se na Rua Frei Mariano e na Avenida General Rondon, sempre acompanhados pela Banda de Música do 17º Batalhão de Caçadores. A mais famosa das batalhas de confetes foi a do carnaval de 1946, o “Carnaval da Vitória”, o primeiro após a vitória das forças aliadas na II Guerra Mundial.
        Nesse carnaval de 46 os “formigas” (rapazes irreverentes do bloco Formigueiro) resolveram fazer crítica à crise econômica do pós-guerra e às greves que aconteciam em todo país. Desfilaram na Avenida puxando uma carroça com um jegue desacorçoado em cima. Na carroça estava escrito: “guerra dos burros!”.
        No carnaval de 52, apesar da chuva, sagrou-se campeã das escolas a Ditadores do Samba. É necessário afirmar que repórteres de jornais do Rio e São Paulo vinham cobrir o ”enterro dos ossos”, outra tradição do carnaval corumbaense.
        E o carnaval de 1960 chegava com a música: “Hei, você aí, me dá um dinheiro aí...” o dinheiro (como sempre) não estava fácil para o povo, mas a festa foi um barato, pernas de todo lado, até o poeta Clio Proença comentou no jornal O Momento na sua coluna Marolas: “Meninos, este carnaval que passou só deu pernas. Pernas finas, grosas, pretas, brancas, cabeludas e tortas. Pernas femininas! Este carnaval mostrou que para brincar e pular é preciso ter pernas!”.
        Com pernas ou sem pernas de fora, quem faturou nesse carnaval de 60 foi a Escola de Samba Flamengo e os cordões Cravo Vermelho e Paraíso dos Foliões, dobradinha infalível de muitos carnavais.
        E como história se faz de lembranças, a Escola de Samba Império do Morro, sob o comando do Chá Ana e da Dona Venância, carnavalescos de “chapa e cruz”, saiu com aproximadamente 1800 componentes no carnaval se 1985. A Imperatriz, da família Cambará, foi outra escola que levou animação para a avenida e fez a alegria dos antigos carnavais.
        As músicas eram cantadas com vibração. Nossos compositores (como hoje) faziam marchinhas e sambas-enredo em cima de temas que falavam da história da cidade, da fauna e flora pantaneiras, do lendário vapor Fernandes Vieira e da Cidade de Corumbá, vapores que ligavam Corumbá a Porto Esperança.
          O carnaval corumbaense atravessou um tempo histórico e hoje vem se profissionalizando e se destacando cada vez mais.            
          Ele não está morrendo como muitos falam, apenas sofreu mudanças infraestruturais, não é mais aquele, o tempo é outro, as músicas também são outras, o gosto da galera ainda se prende às bandas baianas. Até os desfiles das Escolas de Samba são diferentes, mais dinâmicos, mais iluminados, mais frenéticos: a Pesada, a Vila Mamona, a Mocidade Independente da Nova Corumbá, a Império do Morro, a Caprichosos de Corumbá e tantas outras, atraem turistas e divisas ao município.
         Daqueles velhos carnavais só restam imagens em preto e branco. Cabe a nós então resgatá-las para que não sejam varridas pelo tempo do esquecimento. Cabe a nós o trabalho de contar o universo de encanto e magia que sempre envolveu a cidade: traços da sua história, valor do seu patrimônio – porque isso são Cultura e Educação.
         Deixem as bandas baianas fazer a hora da moçada com guitarras eletrizantes e trios elétricos sonoros. Não se preocupem com elas, um dia passarão. Deixem que rebolem os bunbuns e soltem as frangas! Que povo corumbaense, neste carnaval de 2011 vai mostrar alegria e tradição, não se esquecerá de esquentar os tamborins, as cuícas e os pandeiros. Não vai deixar de cultivar a espontânea alegria da sua arte e da sua cultura, para cantar com vibração o tradicional e já clássico: “Boa tarde, boa tarde, nós estamos aqui, com o Flor de Abacate pra sambar até cair. No trabalho e na luta mais um ano passou, Flor! Flor! Flor! Carnaval já chegou...”
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Augusto César Proença é escritor corumbaense.




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